Goiana recebeu da PNAB o valor de R$ 593.622,33, que deveria ter sido executado no ano de 2024 e não fez. Com o prazo final de execução até o dia 30 de junho de 2025, a classe cultural goianense está preocupada por não ver a gestão municipal realizar alguma ação para publicar o edital, correndo o risco da cidade perder este benefício.

Por Hevelyne Figueirêdo
Quando a pauta é política pública para à cultura na cidade de Goiana, as iniciativas do governo municipal falham em demonstrar a necessária competência. Enraizada em um contexto histórico de práticas de políticas de balcão, que perduram há um tempo em nossa cidade, deixando a classe artística e toda a cadeia produtiva dependentes de seus representantes políticos.
A política pública chega como uma ferramenta importante, para o rompimento desse sistema, pois, uma vez implementada pelo Estado, tem o objetivo de garantir o direito à cultura, a democratização do acesso a ela e a valorização das manifestações culturais. Temos como exemplo, a PNAB-Política Nacional Aldir Blanc de Fomento à Cultura que foi criada para apoiar o setor cultural durante a pandemia e, posteriormente, tornou-se uma política permanente de fomento à cultura.
Goiana recebeu da PNAB, o valor de R$ 593.622,33, que deveria ter sido executado no ano de 2024. O município fez a adesão do recurso junto ao governo federal, elaborou o plano de ação, no dia 25 de maio de 2024 reuniu toda a classe artística numa audiência pública para a aprovação do PAAR (Plano Anual de Aplicação de Recursos), fez a adequação orçamentária para executar e simplesmente não executou. O prazo encerraria no dia 31 de dezembro de 2024 e mesmo realizando todo passo a passo, a Secretaria de Turismo e Desenvolvimento Cultural de Goiana, sob a administração de Roberto Pereira na gestão do ex-prefeito Eduardo Honório, não finalizou e o edital não foi publicado.
Uma segunda chance foi dada e, no dia 22 de novembro de 2024, através do Decreto nº12.257, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva alterou os prazos de execução da PNAB, prorrogando a execução dos valores recebidos para o dia 30 de junho de 2025.
Chegamos em 2025, Goiana com uma nova gestão, no poder executivo o prefeito interino Eduardo Batista e na administração da Secretaria de Turismo e Desenvolvimento Cultural, o vereador Alexandre Carvalho. Apesar das expectativas da classe cultural pelo lançamento do edital, assim como na gestão anterior, nenhuma ação é tomada e o edital da PNAB não é publicado. Importante falar que, dentro do valor destinado a cada ente federativo, já consta uma parte destinada à consultoria e assessoria para executar o processo. Ou seja, bastava apenas terceirizar o serviço, com a contratação de uma empresa que pudesse conduzir os trâmites, mesmo assim, nada foi feito.
As duas gestões não conseguiram dar encaminhamento a um único edital, para colocá-lo na rua, reafirmando assim, o problema crônico existente no nosso município quando o assunto é a política pública cultural. Ressalto que o dinheiro está em conta desde 2023, estamos há praticamente 1 mês para o prazo final de execução do recurso, que de forma simplificada consiste em tirar o dinheiro da conta da prefeitura, colocar o dinheiro na conta do projeto, publicar o edital e contemplar os selecionados.
É o que acontece se a PNAB não for executada?
Os recursos serão revertidos para o fundo estadual de cultura ou devolvidos à União, além de o município ficar com pendências e não poder participar de futuras edições da PNAB. Goiana precisa executar pelo menos 60% do recurso até o final de junho para poder receber o segundo ciclo. Se não executar, não receberemos esse fomento.
Diante dessa tragédia anunciada, fica evidente a falta de compromisso dos nossos governantes com a cultura local. E não é de hoje, a ausência de representação no legislativo e executivo quando a pauta é cultura nos deixa à mercê de legisladores, que desconhecem a importância do setor na construção da história do município, no turismo, na educação, no patrimônio e na economia da cidade.
A prova disso é a luta, que dura mais de 10 anos, dos agentes culturais pela implementação do CPF (Conselho, Plano e Fundo) da Cultura, que, após um longo período de batalhas, foi fortalecida pela Lei Paulo Gustavo, que estabeleceu um compromisso dos municípios com o fortalecimento do Sistema Nacional de Cultura, consolidando assim a criação dos sistemas municipais.
Atualmente contamos com o 2º Conselho Municipal de Cultura, que foi eleito para o biênio 2024/2026, com uma importância singular nessa ação, porém, encontra-se incompleto, pois até a presente data, a gestão atual não indicou os membros do poder público que deveriam compor o conselho, estando apenas com os representantes da sociedade civil. Se voltarmos um pouco, para lembrar como foi a condução da Lei Paulo Gustavo em Goiana, confirmamos o desinteresse da pauta pelos nossos governantes.
A Lei Paulo Gustavo (LPG), teve uma condução similar à da PNAB. Ela foi iniciada nos discursos proferidos por alguns vereadores, falas horrendas que não merecem nem ser repetidas nesse texto, que aconteceu quando a lei passou pela Câmara José Pinto de Abreu para ser formalizada, através de um projeto de lei para adequação junto ao orçamento municipal. O despreparo, desconhecimento e insensibilidade de alguns dos legisladores foram escancarados naquela sessão. A lei passou na câmara e, após essa etapa, através da luta dos agentes culturais nas redes sociais e em reuniões na secretaria, o edital foi lançado.
O edital com alguns erros, prorrogações de resultados e prazos, saiu e alcançou uma pequena parcela do setor cultural. Esperava-se que um outro edital com o dinheiro que sobrou junto com os rendimentos da conta fosse publicado, porém, o município preferiu devolver o dinheiro a optar por um segundo edital. Foram devolvidos aproximadamente 52% do valor recebido do Ministério da Cultura. Goiana recebeu R$ 699.460,06 e só executou 47,54%, devolvendo aproximadamente a quantia de R$407.453,75. Repito, por extenso, quatrocentos e sete mil, quatrocentos e cinquenta e três reais e setenta e cinco centavos. Esse valor, oriundo de um auxílio emergencial, que deveria ser repassado para o setor cultural através de um edital para o fomento de ações de audiovisual e atividades culturais da Lei Paulo Gustavo, foi devolvido.
Entendem a gravidade disso? A cidade dos caboclinhos, de burrinhas, bois, mestres, filarmônicas, artesões, cineastas, atores, escultores, artistas plásticos, brincantes da cultura popular, poetas e músicos. Todos trabalhadores da cultura e toda uma cadeia produtiva que se move junto, como técnicos, costureiras, produtores, educadores, mediadores, pesquisadores, profissionais da comunicação entre outras profissões, foram prejudicados.
Diante de tantos absurdos, ficam as seguintes perguntas:
- Não aprendemos nada com a LPG?
- Vamos devolver mais de meio milhão de reais da PNAB?
- O que nós, enquanto sociedade civil, podemos fazer diante dessa situação?
- O quanto ainda perderemos?!
Não tenho as respostas.
Deixo aqui as minhas reflexões para que possamos repensar e tentar construir estratégias para um futuro mais digno do setor cultural em Goiana.
Este artigo tem como objetivo falar sobre a condução das políticas públicas para a cultura nos últimos anos na nossa cidade, que fique registrado para a posteridade o quanto os nossos gestores ignoram o setor cultural em Goiana.
REFERÊNCIAS
MINISTÉRIO DA CULTURA. Política Nacional Aldir Blanc de Fomento à Cultura.
Disponível: https://www.gov.br/cultura/pt-br/assuntos/politica-nacional-aldir-blanc/valores-2. Acesso em 17 de maio de 2025.
MINISTÉRIO DA CULTURA. Painel de dados. Utilização dos recursos Lei Paulo Gustavo.
Disponível: https://www.gov.br/cultura/pt-br/assuntos/lei-paulo-gustavo/acesso-a-informacao/painel-de-dados. Acesso em 16 de maio de 2025.
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