DO RAP AO TRAP: AS INSPIRAÇÕES DA CULTURA HIP-HOP GOIANENSE

Saiba como o Rap feito em Goiana vem ganhando cada vez mais relevância.

Participação do Movimento “RIMA NA 13” no Noite do MATA Goiana em 23/10/2019
(Foto: MATA Goiana)

Por Guilherme Souza

A praça da 13 como palco da cultura alternativa

Praça João Pessoa, popularmente conhecida como “Praça da 13” ou ainda para os mais íntimos, simplesmente, “a 13”. Desde os anos 90 e até mesmo antes, essa praça foi o ponto de encontro de jovens, mas é no início dos anos 2000 que a 13 começou a ser palco de manifestações culturais alternativas, onde jovens que não se encaixavam no senso comum do entretenimento da cidade, encontravam nesse ambiente o local adequado para se divertir. Com o passar do tempo, essas manifestações foram ganhando mais identidade e organização política no sentido de perceber a importância da ocupação cultural de um espaço público, com eventos multiculturais, agregando shows, recitais, pinturas e outras expressões artísticas. O que esses jovens tinham em comum era o apreço pelo Rock, mas também pela música regional, como as rodas de coco, uma característica que acabava por unir diferentes públicos. O evento Joey Jambo, por exemplo, refletia muito bem o espírito do cenário alternativo goianense: era um evento baseado na filosofia Punk do “faça você mesmo”, porque não recebia nenhuma ajuda oficial da Prefeitura, tudo era feito pela vontade de fazer acontecer de seus idealizadores, de viver a cidade de outra maneira que não fosse através da cultura de massa. A 13 acabou por se tornar referência cultural em Goiana.

Como todo ciclo evolui para eventualmente ter seu desfecho, a era do Rock em Goiana ficou dispersa e tomou outros rumos, enquanto as manifestações de cultura popular continuaram descentralizadas, ocupando outros espaços. A 13 então começou a testemunhar a ocupação de outra cultura, que na verdade já coexistia de forma mais tímida e com poucos adeptos, mas igualmente contestadora: o Hip-Hop. Mas, para falar do cenário atual, é preciso lembrar dos eventos realizados pelo importante movimento cultural Silêncio Interrompido, que deu palco e visibilidade para o primeiro grupo de Rap goianense, o R.V.A (Rapaziada Voz Ativa).

R.V.A – Rapaziada Voz Ativa, o primeiro grupo de Rap em Goiana

Formado em 2009, o R.V.A surgiu inicialmente como a ideia de um coletivo de Hip-Hop que abordasse elementos essenciais da cultura: a musicalidade do Rap, o DJ, o grafite e o Break, mas como na época existiam poucos adeptos, resolveram focar apenas na música. A primeira formação era: Netho, Borracha, R.V, Muller e DJ Ricco. Com o passar do tempo, a formação foi mudando e o R.V.A ganhando destaque na cena pernambucana, quando em 2011 teve a música “Amo o que faço” escolhida para representar Pernambuco na “Coletânea de Rap Nordestino”. O grupo seguiu produzindo eventos beneficentes nas comunidades de Goiana e já abriram shows de grandes nomes do Rap Nacional, como Rapadura, Zé Brown, Facção Central, Preto Aplick Ch e outros. Lançaram o EP “Entrando em Cena” em 2012 e o “Da Vida ao Verso” em 2016 e no ano seguinte eles deram uma pausa. “Demos uma pausa pois alguns integrantes decidiram parar, e naquele momento a melhor coisa a se fazer foi viver outras experiências na música, de forma solo”, explica Netho H$M, o único integrante remanescente da formação original.

Nesse meio tempo, a conjuntura política do Brasil foi se tornando cada vez mais polarizada e hostil, e era necessário assumir um lado ideológico. Como o movimento Hip-Hop é historicamente contestador, denuncia as mazelas sociais e canta através do Rap sobre as opressões do Estado contra o povo preto e periférico, além das narrativas do cotidiano, não seria logicamente aceitável um indivíduo conservador dentro do movimento. “Os demais integrantes não fazem mais Rap. Um integrante cogitou retornar ao grupo, porém, como ele agora compactua com as ideias do atual presidente, preferiu não voltar, pois isso seria correr totalmente contra o movimento Hip-Hop”, afirma Netho.


R.V.A (RAPAZIADA VOZ ATIVA) – O BAIRRO

Pausa acabada, atualmente o R.V.A conta com Netho H$M e Professor MC, que apesar de ser mais novo no movimento Hip-Hop, já é um dos MCs mais desenvolvidos da cena nas batalhas de rima em Goiana. “Aprendi muito com os caras das antigas e de certa forma o R.V.A foi que me mostrou o real mundo do Rap, o real curso da cultura. Netho basicamente me mostrou um mundo que eu não conhecia”, explica o Professor, que mesmo antes do convite para integrar o grupo, era bboy, popper e frequentava a 13 rimando apenas por diversão. Quando perguntado sobre a motivação para retornarem as atividades, Netho revela: “A maior motivação é essa nova geração do Rap que tem a mente mais aberta, e muitas pessoas pediram o nosso retorno. Estamos trabalhando em músicas novas, algo bem atual, mas com nossa essência. Pretendemos lançar alguns clipes também. Apesar da pandemia, estamos numa fase maravilhosa, muito entrosamento entre eu e o Professor… O que está por vir é realmente um novo R.V.A, com mais maturidade, experiência e musicalidade.”

A influência contínua do Mano DurapSom

Quando se fala de Rap em Goiana, DurapSom é referência certa. Tendo morado em São Mateus, zona leste de São Paulo, teve seu primeiro envolvimento com a cultura do Hip-Hop através do grupo Consciência Humana e da DRR Posse (Defensores do Ritmo Rua), que teve influência sobre sua formação moral. “Na época não tinha pai e tal, e escutar aqueles rap pra mim é como se fosse meu pai me dando um conselho, pra não seguir um caminho errado e o Rap dos anos 90 falava sobre política, criminalidade, essas coisas bem diferente do tempo de hoje, que fala mais sobre festa, ostentação, essas coisas.” Mais tarde, ela monta o grupo de Rap Voz Ativa, que fez algumas apresentações,mas sua mãe resolveu voltar para Pernambuco e chegaram em Goiana no início dos anos 2000. “Tudo o que a a galera não tem um certo conhecimento, crítica logo, né? E naquele tempo quem escutava Rap praticamente era já julgado como bandido, maconheiro, essas coisas e no caso, eu sempre gostei de rimar, mas quando cheguei aqui (em Goiana), não encontrei pessoas que se identificassem com o gênero, então eu andava mais com os roqueiros, porque não tinha um pessoal que curtia Rap e a galera do Rock era o pessoal mais alternativo que eu conhecia aqui na cidade.” Ele foi um dos primeiros a difundir a música Rap em Goiana e região por meio do Orkut, criando uma comunidade chamada Batalha de Rima Brasil, onde ele postava suas rimas e organizava batalhas de rima através da escrita, incentivando seus membros a escreverem. A comunidade foi crescendo, se tornando conhecida por todo o Brasil e foi de lá que surgiram MCs que hoje são consagrados como a Issa Paz, uma das integrantes do Rap Plus Size.

RAP Plus Size – O Pano Rasga

A internet, mesmo com as limitações da época, teve um papel fundamental na absorção e divulgação da cultura Hip-Hop por DurapSom. Se hoje em dia, as Lives feitas através das redes sociais são a principal ferramenta para o músico interagir com os fãs, e os amigos poderem se contatar virtualmente devido as complicações causadas pelo Coronavírus, naquela época, DurapSom já organizava as batalhas virtuais de rima Freestyle por meio do Skype e cada MC era de um Estado diferente. Ele também chegou a criar um blog de relevância, que expandia suas atividades para além da comunidade do Orkut. No blog, além da música Rap em si, ele abordava com mais profundidade os outros elementos do movimento Hip-Hop, temas como causas sociais, protestos e outros assuntos pertinentes que pudessem agregar conhecimento na formação cultural alternativa. Como colecionador da mídia impressa, ele colecionava revistas, cds e fazia coletâneas independentes em fita K7, sem nenhuma intenção de lucro financeiro, apenas com a intenção de propagar a música que gostava, uma vez que aqui o Rap ainda não era muito difundido. Com o tempo, os apreciadores começaram a aparecer e se encontravam na praça da 13 para tomar umas biritas, andar de skate e no final, sempre acabavam numa roda de Freestyle. Foram desses encontros que bandas de Rock goianenses surgiram, como a Zefadeão e a Holy Smoke, ambas influenciadas pelo New Metal, subgênero do Heavy Metal que combina elementos do metal com outros gêneros, como o Rap. DurapSom afirma que o movimento foi crescendo aos poucos: “Eu já tava mais evoluído, várias pessoas já tavam curtindo Rap por aqui, já não conheciam apenas Racionais e Facção Cental, porque na época parecia que só existia isso aqui no Nordeste. O conhecimento hoje em dia tá bem propagado, qualquer pessoa hoje em dia bota ali no Youtube e já vem as sugestões de Rap, as informações tão bem mais fáceis. Você vai ver um vídeo aula e já aprende como fazer um beat e o pessoal tá evoluindo cada vez mais em clipes, produção, eu fico muito feliz por conta disso”.


“Entrando em Cena”, composição de Durapsom quando ainda fazia parte do R.V.A

Movimento Rima na 13:

a ocupação necessária dos espações públicos e a importante inclusão das minorias

Mesmo com todas as dificuldades, o Rap e a cultura Hip-Hop como um todo só vem crescendo em Goiana e ganhando mais visibilidade nas mídias sociais, muito em decorrência do engajamento social dos novos adeptos que fazem parte de movimentos culturais, tais como o Movimento Rima na 13 (sendo DurapSom o primeiro idealizador) que desde 2012 está na ativa, tendo algumas pausas na trajetória, mas que hoje atua com força total, sempre realizando eventos semanais aos sábados (antes da quarentena), na própria praça 13 de Maio. O movimento, que nasceu sem grandes pretensões além do entretenimento, se tornou uma referência na Zona da Mata como organização das batalhas de Rap. O Rima na 13 faz parte de um campeonato com seletiva nacional, onde o MC que ganhar a batalha em Goiana, vai para Recife com outros vencedores de Pernambuco e apenas os dois melhores serão selecionados para disputar com outros dois de cada Estado, então é formada uma Liga para saber quem vai ser o campeão brasileiro das batalhas de rima. Outros distritos de Goiana e interiores da região começaram a organizar batalhas inspiradas no método da Rima na 13, a exemplo de Timbaúba e na praia de Acaú. Mesmo em Goiana, outros praças foram sendo ocupadas com a intenção de descentralizar o Movimento para torna-lo mais presente e dinâmico, surgindo assim a Batalha do Wi-Fi e a Batalha da Duque, realizadas nas praças de mesmo nome e em dias diferentes da semana.

Independente de competição, o Rima na 13 é considerada uma grande família pelos que fazem parte dela. Apesar de existirem outros pontos de batalha, é na 13 que o movimento Hip-Hop goianense se estabiliza e ganha maior notoriedade e público, devido ao fato de ser uma praça central da cidade. Se hoje muitos MCs possuem grande desenvoltura, foi por causa da aceitação e incentivo que tiveram pelos outros membros que já faziam parte da cena e passaram pelo mesmo processo de identificação acerca das vivências e singularidades de cada um. Ano após o ano, a cultura Hip-Hop tem se mostrado cada vez mais ligada com as pautas sociais e o avanço democrático, principalmente no que diz respeito a inclusão das minorias produzindo arte. Se no começo o cenário nacional era predominantemente composto por homens, denotando até um machismo latente, atualmente é cada vez menos aceitável esse pensamento construído por uma base reacionária, porque não há como normatizar aquele que oprime convivendo com os oprimidos. Além da sensação de pertencimento, é preciso ter consciência de classe para que nenhum tipo de preconceito possa ser legitimado.

Dalva, uma das poucas mulheres que marcam presença atuando nas batalhas de rima em Goiana, já foi campeã diversas vezes nas competições da Rima na 13, Batalha do Wi-fi e participou em outros eventos fora da cidade. Seu primeiro contato com os movimentos de Rap na cidade foi justamente na Praça 13 de Maio, onde ela afirma ter se encantado com os improvisos, e a partir de então foi conhecendo mais da cultura Hip-Hop. “Eu sempre amei poesia, e na batalha eu tinha o desafio de construir versos improvisados, então essa adrenalina do improviso me motivou. A minha inspiração com certeza sempre foram os meninos daqui, cada um com sua história, batalhas diárias.”

É fato que as mulheres não recebem o devido reconhecimento na indústria da música, desde o alto escalão até no underground, mesmo no cenário alternativo como um todo, onde se supõe que seus adeptos sejam progressistas, embora escondam algum tipo de machismo enraizado na cultura patriarcal. Quando questionada sobre a convivência com os membros envolvidos nos movimentos, Dalva fala logo de cara: “Difícil. Não é vitimismo. É comprovado. No Hip-Hop, a área mais difícil para a mulher é na batalha de MCs. Não existe valorização em vários aspectos. Uma MC mulher se esforça tanto quanto um cara para fazer uma boa batalha, e aí acontecem suas situações: ou falam que ela é ruim (porque sempre estão exigindo que ela se sobressaia), ou falam que ela é boa, tipo ‘pra ser uma mulher, ela é boa. Representa.’ Pra ser mulher numa batalha é necessária muita resistência.”

Indevidamente desprezadas por anos, as mulheres, bem como membros da comunidade LGBTQ, têm conquistado espaço dentro do Rap quebrando estereótipos, evitando clichês e criticando pensamentos e atitudes que desde muito tempo atrás foram normalizadas, como a mulher ser apenas um objeto sexual ou a velha história batida do “sexo frágil”. Mas não é apenas para resistência em si que elas vão conseguindo espaço: é também pela dedicação no lirismo com consciência de seu papel na sociedade, o empoderamento e como subverter um sistema patriarcal. “Eu lidava tentando dar o meu melhor, treinava muito. Meu objetivo era realmente ser a melhor na minha cidade, ir pra estadual (competição) e tal, pra provar que era boa. Mas não adianta não. É como dar murro em ponta de faca. Eu super admiro a resistência da galera, meninas que tão nessa faz tempo. Inicialmente, outras meninas batalhavam, mas ano passado (2019), só eu. Tomara que esse ano alguma se anime novamente pós pandemia”, revela Dalva que, desiludida com o machismo que sofria por alguns, acabou deixando de participar das batalhas de rima no momento.

E ela completa: “A importância da mulher no Hip-Hop é ter mulher no Hip-Hop. Por que não tem? Vamos quebrar esse tabu. Em Goiana, a cena das batalhas é predominantemente masculina. Precisa sim de mais minas colando. As minas são boas, só têm medo de botar a cara numa batalha”.

Educação, produção e evolução constantes

Todos os MCs entrevistados para essa matéria possuem suas histórias, singularidades e diferenças de estilo na hora de compor e rimar, e quase todos afirmam que tiveram seu primeiro contato com o Rap de forma descompromissada, vendo vídeos de batalhas freestyle no Youtube sem nenhuma pretensão além do entretenimento. Contudo, era de se esperar uma aprofundamento intelectual na cultura quando se está imerso dentro dela e se maravilhando com as descobertas.

Uma vez percebida a rica extensão cultural do Hip-Hop, com foco na música, é possível seguir vários caminhos distintos, desde letras abordando um lado mais sentimental, até outro de contexto totalmente político, que por consequência acaba se tornando educacional. RT MC, que no seu perfil do Instagram se autodenomina como “Marginal Influencer”, explica sua percepção sobre o preconceito que o movimento ainda sofre na cidade: “No começo a gente via muitos olhares distorcidos, infelizmente, e hoje em dia ainda vemos, mas de uma pequena parcela. Estamos mostrando que é uma cultura sadia e estamos provando isso da melhor forma, no meio educacional. Eu fundei o projeto Hip-Hop Educacional, colocamos o Rap dentro da escola e estamos tendo uma visibilidade muito boa, o pessoal tá vendo que o Rap pode ser uma discussão em uma sala de aula. Estamos fazendo a nossa parte para tirar essa visão distorcida do Rap.” RT, que também faz parte do Rima na 13, é um dos MCs que faz questão de deixar explícito seu posicionamento político, tendo recentemente lançado o clipe da música “1999”, onde faz críticas ao governo bolsonarista e seus seguidores. “Classifico meu som como um som de desabafo, pra gente realmente queimar o fascismo que existe dentro do Rap, existe muito fascismo escondido, muito conservadorismo e a mensagem que eu quis passar foi justamente essa, envolver também um contexto histórico, pois falei sobre o período da ditadura e a pretensão foi essa, pra galera pensar e rever seus atos, a galera que tá dentro do próprio movimento.”


rT – 1 9 9 9 (prod.JovemOtto), videoclipe gravado numa casa abandonada na Rua Direita

Outro membro do Rima na 13 que também vem mostrando seu trabalho através do audiovisual é Lewan, que já tem seu videoclipe da música “Mais triste que Luiz Lins” divulgado nas redes sociais. Ele conheceu o local da gravação por acaso. Saiu de carro com o irmão e mais um amigo para irem tomar banho de rio perto da Usina Maravilha. Antes de voltarem para casa, resolveram entrar no Engenho Jacaré e explorar uma casa. Ele ficou tão maravilhado com o local, que antes mesmo de compor a música que dá nome ao videoclipe, já estava decidido que iria gravar lá. “Eu nem sonhava em ter feito essa música ainda, mas já me via gravando meu primeiro clipe ali. Aquele local me trouxe um misto de sentimentos uns tristes e outros felizes. Feliz por ter me sentindo em paz, mas triste por não saber o que houve com aquele local. Eu queria ter conhecido antes de ser o que é hoje.”


MAIS TRISTE QUE LUIZ LINS, videoclipe gravado em Goiana, no Engenho Jacaré

Lewan classifica seu estilo musical como Sad-Trap, subgênero do Rap e Lo-fi, estilo de produção musical que usa técnicas de gravação de baixa qualidade, podendo ser devido a limitação financeira do artista ou simplesmente por uma questão de estética sonora. Sobre seu processo de composição, Lewan afirma: “Eu não consigo compor algo que não seja de mim, saca? Todas as minhas composições de Lo-fi foram criadas pelo que passei, pessoas que conheci e etc… falo muito de sentimentos porque é algo que está dentro e fora de nós.” Como um adepto do subgênero que só vem conquistando mais fãs ao redor do mundo, Lewan não quer se limitar as influências de Goiana, e mesmo reconhecendo a importância cultural da cidade, ele manda a real: “Goiana tem muitos músicos fodas, que só precisam de atenção. Porém, eu não me retrato muito do que Goiana pode me influenciar além da própria Rima na 13! Eu não consigo olhar pra Goiana e ver uma influência foda além dos meus amigos, saca? Mas vejo muito cultura não vista morrendo por falta de atenção. Não gosto de limitar meu sonhos, quero ganhar espaço para inspirar uma geração, ser orgulho pra família e viver disso! Quero ganhar prêmios importantes, gravar com as pessoas que me inspira seria um feito importante pra mim e eu fico feliz por esse começo, esse novo ciclo está me mostrando uma pessoa nova.”

Uma galera que vem fazendo seu nome na cena do Hip-Hop em Goiana é a CallCommunication. Formado por Mora$, Const, Menino de Ouro, YungBoo, 1Louco, $NCA e JovemOtto, o coletivo se juntou pelas ideias em comum, mas de uma forma que cada um pudesse exercer sua influência para somar no resultado final. No canal do Youtube, a CallCommunication é bem prolifera, com diversos videoclipes curtos, de produção Lo-fi, simplista e eficiente na mensagem, seja ela no modo mais sentimental do Trap, ou na pegada Boombap, vertente do Rap mais antigo lá dos anos 90, mas com uma estética mais contemporânea. “A Call faz tudo, é só olhar que são músicas com propostas totalmente diferentes, mas a gente tá fazendo mais Trap”, afirma $NCA.


O último videoclipe lançado pelo coletivo CallCommunication

As ferramentas que a tecnologia aprimoram a cada dia é fundamental para a composição e produção das músicas no estilo Trap. Os softwares de produção musical vão ficando cada vez mais avançados, a ponto de ser possível ter um mini estúdio no próprio celular e daí deixar a criatividade tomar conta. “Desde o início foi tudo independente, saca? Gravávamos a música pelo IPhone e tal, hoje gravamos no quarto com um PC mais ou menos e um microfone, mas a gente investe no sonho, porque é bom fazer música e saber que a galera da cidade gosta. Esperamos um dia levar o nome da cidade para outros lugares jamais alcançados”, reconhece $NCA.

A nova geração da cultura alternativa em Goiana tem cada vez mais o anseio de sair dos limites da cidade, porque visam o sucesso para além, considerando a antiga problemática de Goiana não dar valor aos artistas da terra, precisando que eles sejam considerados primeiro fora, para depois serem reconhecidos dentro, como explica $NCA: “A gente não visou movimentar apenas a cena de Goiana, mas outros patamares… a gente só quer fazer nosso som, lançar e ser feliz, saca? Fazer show e tentar viver disso um dia. A gente junto consegue construir vários sons da hora. Se a gente fosse lançar tudo o que a gente já tem… mas é melhor ir aos poucos. Vamos tentar cada vez mais melhorar as coisas por nós e pelo movimento em Goiana. A cultura daqui é rica e tem vários artistas de vários estilos. No Rap já tinha o R.V.A, não sei se existiu outros grupos antes, mas nós somos o grupo que deu aquele Up na cena.”

https://www.youtube.com/watch?v=RmyvCiOuHks

R.I.P. Fake Gang – (Const, Mora$, YungBoo) (Prod. JovemOtto)

A cultura Hip-Hop e principalmente o Rap vem se tornando cada vez mais comercial, uma vez que a mídia corporativista está cooptando os discursos progressistas e os embalando como produtos sem identidade para serem consumidos. Se antes os temas abordados pelo Rap eram pertinentes apenas a juventude preta, agora ele faz cada vez mais sucesso entre a classe média branca, que não tem a mesma vivencia das periferias e não sofre preconceito ou racismo de qualquer ordem. Mas isso não impede que a comunicação seja falha, porque ela acaba por expor uma realidade que sempre foi marginalizada e agora, ela pode ser melhor compreendida, construindo um senso crítico tão necessário nesses tempos de governos conservadores e anti-cultura. É preciso estar atento para não cair nas armadilhas do mercado fonográfico regido pelo sistema capitalista, que tende a esvaziar valores importantes de uma cultura de resistência e “esbranquiçar” teorias e conceitos para ficarem mais suaves e adequados a percepção colonialista que ainda assombra o nosso país. Contudo, o movimento Hip-Hop em Goiana, principalmente através do Rap e por meio de seus MCs, vem construindo uma cena cada vez mais forte na irmandade, ligada com as minorias e pronta para combater preconceitos.

O RAP EM GOIANA VIVE

  1. Viagem no tempo de uma outsider temporária. Insider de cabeça. Força para quem tem pq nunca desistiu. A cidade é o cenário. Da 13 ao 65. SIMBORA que temos PRESSA

    Comentário por Cristina França em julho 27, 2020 as 5:09 pm